quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Do que foi feito Novembro


O tempo é que vai passar
A gente só vai rodar

Já é novembro amor, aquele novembro do Sol raiando clareando tudo nesse gerúndio preguiçoso e aberto, brincando com a gente se pondo aos poucos por trás da janela da cozinha. Veio sorrateiro assim ou fui eu quem me desliguei olhando tanto o relógio esperando chegar que veja, está aí por trás da porta nosso fim de ano de resoluções já prontas? 
Você se lembra de quando desfiávamos pétalas de margaridas que você roubava da sacada do vizinho do segundo andar, se pendurando e me fazendo tremer do medo de você por bobeira de me presentear se perder? Pois me lembro das tardes de Sol laranja feito o sorvete de tangerina que derretia no pires que você insistia em usar para tomar sorvete e me irritar, eu me lembro do entalhe que havia nos talheres do almoço quase naturalista que você uma vez me fizera, salada e salada e não havia mais necessidade de mais nada, a gente se tinha para matar a fome, a gente se tinha para matar o tempo, para matar a vida e morrer de amor e reviver de paz, de plenitude jogados em um lençol que não sei dizer se era branco ou azul claro porque era o céu refletido nele.
Eu nunca fui capaz de entender como a sua presença alterava de tal forma os meus sentidos que eu quase conseguia decorar toda a cena, o chão com aquela poeirinha baixando de cinco da tarde e você de pés branquelos e molhados desfilando pela casa, toalha mal amarrada na cintura, a razão me implorando um descuido só para dar um pulo no seu mundo tão fantástico, tão feito pro meu sonho de brinquedo desenhado ainda menina. Eu, você, nosso pequeno castelo, nosso faz de conta que nunca mais passaria novembro.
E veja bem amor, é outra vez novembro, outra vez essa mistura de primavera que é verão e o vizinho se mudou, na varandinha ao lado da nossa não existe sequer sombra do que foram flores brancas um dia. A cortina anda de tal jeito desbotada que não diferencio mais se há sol, até ontem foi o outubro de chorar o modo como você foi arrancado de mim e hoje acordei com esse novembro me beijando a nuca, aquele beijo que era só seu, que vinha de manhã perfumar meu leito de café com leite fresquinho e pão com ervas e hortelã.
Fez sol no seu novembro amor, fez sol dentro de mim pela primeira vez desde que veio qualquer coisa que não tento nomear e que uns chamaram de destino e o médico cheio de técnicas e estudo prenunciou como tumor, é novembro e você não está aqui mas pela primeira vez eu me sinto livre para não doer o peito ao levantar e olhar a pia da cozinha sem sua bagunça habitual, porque a gente teve o tempo que houve para se ter, não é mesmo?
Porque fosse um dia a mais você teria reparado que minha orelha esquerda é um pouco menor que a direita, coisa de milímetros, mas eu sei amor, eu sei que uma hora ou outra talvez feito meninice de criança viesse alguém e nosso laço tão bem feito se soltaria.
Acordei com novembro me mandando sair da cama e ir plantar margaridas eu mesma, o café não vai ficar pronto sozinho mais, o piso anda seco, feito foi seco meu peito esse ano todo sem você. Mas hoje o céu está molhado, está com aquele Sol laranja molhado que tinham os seus lábios depois de tanto sorvete, depois de tanto me sorver gota a gota, de longe.
Um dia houve um tempo, em um tempo pareceu haver tão poucos dias e eu daria o que tenho para tê-los outra vez, mas o calendário mesmo se mantendo parado no novembro passado insiste em me mandar sair da cama, foi você quem se foi, o que posso fazer é tentar no mínimo te fazer bem, de longe, de longe. Como você vai me fazendo, como fez trazendo o sol, trazendo seu cheiro essa manhã.
Novembro passado eu era sua, hoje sou apenas eu. Esteja você onde estiver, sua eu sempre serei.

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